A Poética da Memória e a Materialidade do Cotidiano
artista Fábio Villares

Curadoria
Rafael Dias


Programa Curatorial
- Análise de produção artística;
- Catalogação;
- Documentação jurídica de autenticidade;
- Texto curatorial;
- Construção de séries de obras de arte;
- Precificação de obras de arte;

A Poética da Memória e a Materialidade do Cotidiano

Fábio Villares

A obra de Fábio W. Villares transita entre a escultura e a pintura, criando uma poética que mescla referências universais da história da arte com um diálogo íntimo das suas memórias e emoções pessoais com a cultura brasileira. Seu processo criativo é baseado em uma disciplina que valoriza os detalhes técnicos e materiais da produção artística, sem perder a intuição que guia no aperfeiçoamento de suas ideias. Para Fábio Villares, as mãos não são apenas instrumentos, mas também são condutores de um fluxo criativo que transforma argila, gesso ou tinta em objetos carregados de significado. As suas obras repercutem com a intensidade do movimento pós-expressionismo, não apenas pela exploração emocional, mas pela forma como utiliza a materialidade para capturar a profundidade da condição humana. Assim como os expressionistas buscaram transcender a representação objetiva, Villares utiliza a escultura e a pintura como meios para dar forma ao invisível – sentimentos, memórias e conexões humanas que atravessam o tempo e o espaço.

Inspirado por mestres como Rodin, Michelangelo, Miró e Picasso, o artista não apenas homenageia os grandes nomes da arte, mas incorpora elementos dessas tradições em camadas cromáticas e texturas que remetem a emoções e a histórias pessoais por cenários onde passou ou em que se inspirou. Suas esculturas e pinturas são pontuadas por um diálogo constante entre forma e conteúdo, em que a estética inicial muitas vezes dá lugar a interferências criativas, revisitando a obra como um espaço de construção contínua do seu trabalho.

Villares compartilha o desejo de dar voz ao que está além da superfície visível. Em sua investigação da figura humana, ele capta gestos, olhares e expressões corporais que revelam mais do que a aparência – elas carregam histórias, memórias e sensações profundas. Assim como Egon Schiele desnudava a fragilidade e a força de seus modelos em traços angulosos e vibrantes, Villares revela, na solidez da escultura, a vulnerabilidade e a complexidade emocional do ser humano.

Ao mesmo tempo, sua paleta de cores e texturas na pintura estabelece um diálogo direto com as atmosferas carregadas de artistas como Emil Nolde e Wassily Kandinsky. Em suas obras, as cores não são apenas elementos decorativos, mas veículos emocionais que comunicam inquietude, celebração ou introspecção. A fusão de camadas cromáticas e texturas em suas peças dialoga com o seu estilo enquanto incorpora uma brasilidade única – as paisagens e o cotidiano que Villares observa e transforma em arte.

Além disso, o uso de temas como relações familiares, esportes e o trabalho cotidiano reafirma sua conexão com a experiência humana universal. Se o expressionismo europeu frequentemente refletia angústias existenciais e traumas coletivos, a obra de Villares traz um contraponto: uma celebração da memória e das relações que sustentam o indivíduo, sua produção oferece ao público um convite à introspecção positiva, um encontro com as conexões que definem a vida.

Os temas que permeiam o trabalho de Villares são profundamente ligados à sua trajetória pessoal e ao contexto brasileiro. Isso se reflete na solidez de suas pinturas, enquanto as paisagens naturais do Brasil encontram espaço em suas construções narrativas, essa brasilidade não é apenas uma inspiração visual; ela carrega uma intenção clara de enaltecer valores humanos e fortalecer o sentimento de pertencimento.

Apesar da densidade de suas inspirações e memórias, Villares prefere que suas obras sejam interpretadas livremente pelo espectador. Ele busca provocar um diálogo emocional, em que a conclusão imagética é aberta, permitindo que cada indivíduo traga sua própria leitura e experiência à obra. Essa abertura reforça sua visão sobre o papel da arte como um campo de encontros simbólicos e experiências sensoriais.

Assim como o expressionismo foi um grito de humanidade em tempos de crise, a obra de Fábio W. Villares emerge como um chamado à introspecção em um mundo acelerado e nos lembram da importância do gesto, da matéria e da memória como formas de resistir à alienação. O artista não apenas cria imagens, mas constrói pontes entre o emocional e o material, entre o particular e o universal, transformando o ordinário em extraordinário.

Em sua trajetória, séries como Minhas Conexões (2006) e Fenômenos da Natureza marcaram momentos de descoberta e síntese entre diferentes linguagens artísticas. A liberdade de expressão, sobretudo ao trabalhar com as mãos, tornou-se um marco em seu desenvolvimento artístico. Atualmente, o artista volta seu olhar para o estudo da figura humana, explorando bustos em novas composições e na pesquisa de materiais como metais e madeira, reafirmando seu compromisso com o contato direto e tátil com a materialidade da arte.

Embora reconheça o papel crescente das novas tecnologias no cenário artístico, Villares mantém-se fiel ao ato manual de criação. Para ele, o processo artesanal carrega uma autenticidade que dialoga com a essência de sua obra: a busca por conexões entre o passado e o presente, o íntimo e o coletivo, o material e o imaterial.

A obra de Fábio W. Villares convida o público a refletir sobre a memória, a identidade e a beleza da materialidade do cotidiano. Em suas obras, encontramos não apenas o reflexo de um artista em constante evolução mas também um espelho para nossas próprias histórias e sentimentos: em essência, um expressionista contemporâneo. Sua obra nos convida a sentir, a refletir e, acima de tudo, a reconhecer a força da arte como meio de expressão e transformação.

Rafael Dias
curadoria

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